22 de julho de 2011

Resenha: Asgard RPG

Conforme imagino que tenha sido de muita ânsia por parte de todos os envolvidos no processo de produção e publicação do caseiríssimo Asgard RPG, finalmente consegui criar uma resenha minimamente prestável a respeito deste RPG, pelo qual Matheus Toledo, nosso já conhecido Odin, e seu time de einherjars RPGistas estão de parabéns (no qual eu também consto nos créditos, como "Colabor Externo". Obrigado por isso, Odin!).

Mas antes de falar de Asgard RPG propriamente dito, só gostaria de fazer um adendo: Acho que foi Maurício de Souza ou Ziraldo que disse numa entrevista que o grande defeito das produções culturais de massa do Brasil (na ocasião, quadrinhos, TV e cinema), é ter uma massa acostumada a super-produções. O brasileiro típico, mesmo quando se interessa de fato por cinema, quadrinhos ou literatura, está acostumado a valorizar apenas a "nata" dessas mídias. Todos adoram Senhor dos Anéis, a novíssima Guerra dos Tronos ou Watchmen, e enchem os pulmões para reclamar da falta de obras dessa grandiosidade por aqui, sendo que temos potencial criativo de sobra para colocar os ianques no bolso... Mas se esquecem que para termos mega-estruturas como essas por aqui, é necessário valorizar os pequenos trabalhos, o circuito underground ou os estúdios de fundo de garagem. Verdade seja dita, também não reclamaria se tivessem meios neste país de pequenos artistas se tornarem grandes artistas por si só. Mas isso sim seria uma outra história que nada teria haver com nosso asgardiano livro.


Agora, falando de Asgard RPG: O livro todo tem um design extremamente seco e simples. Tinta preta sobre papel branco, apenas. Em tempos em que L5R 4th produz uma arte interna de encher os olhos, folgo em saber que ainda há propostas que nos permitem "descansar os olhos que tanto já viram" (Marcel Duchamp). Mas, isso não quer dizer uma arte pobre. Creio que ela ainda poderia melhorar em alguns pontos sem perder a proposta, mas, por mais furiosos que sejam os críticos, uma coisa é certa: Eu adorei a capa! Que aliás, vem em papel lustruso, debaixo da capa típica de um encardenado. Para quem não sabe, o livro é realmente encadernado mesmo. Com espiral transparente e tudo. Anti-profissional? Eu acho que não. Prefiro muito mais este formato do que a lombada que geme nos dando a real sensação de estarmos rasgando um livro caro toda vez que ele é aberto.

Após duas páginas e meia de introdução sobre "O Que é RPG" (um volume muito maior que em muitos RPGs), somos apresentados às mecânicas principais do sistema: Os Atributos de personagem. Jogadores mais calejados em D&D nem estranharão tanta coisa aqui. Temos apenas algumas mudanças. Saem Destreza, Constituição, Sabedoria e Carisma, para entrar Agilidade, Vitalidade, Presença e Prontidão respectivamente. Elas não visam necessariamente substituir umas às outras, porém. Presença é praticamente idêntico ao "Panache" de 7th Sea, além de servir como base de cálculo para a "mana" dos personagens (outra inovação mecânica de Asgard), por exemplo.

O sistema básico de rolagens também é outra novidade. Sai o d20 entram 3d6. Estou longe de ser um especialista em probabilidade, mas isso deve fornecer resultados mais medianos nas rolagens também. De resto, a mecânica lembra bastante a geração d20. Temos Ajustes ("modificadores"), Testes de Resistência que lembram bastante os de D&D, regras de combate em geral muito próximas às de D&D, magias, pergaminhos, classes... E se isso tudo te soa muito "já vi isso antes", a página 22 é realmente um lampejo nos olhos, com regras para Pontos de Bravura e Pontos de Sorte, que permitem ações muito mais heróicas que o frio "d20+bônus=Sucesso ou falha".

As Tendências eram outro elemento intrínseco de D&D 3.X, mas que aqui se encontram bastante renovadas, fugindo do cruzamento "jogo da velha" de Leal, Neutro, Caótico, Bom (Neutro de novo) e Mau. Basicamente, o personagem segue um conceito adjetivo, como "sádico", "tirano" ou "honrado". Essa mecânica me lembra os alinhamentos de M&M, em que se pode escolher opcionalmente um conceito com o qual seu personagem estará ligado e deverá seguir. As raças também não fogem muito aos princípios D&Desticos, com adição dos Aesires (humanos enormes e fisicamente poderosos), Nornes (humanas que descobrem sua vocação mística e ligação com o destino ainda jovens) e Vanires (seres pacíficos, mas com poder mágico avassalador) aos já carimbados anões, elfos (aqui chamados de elfos da luz), meio-elfos e gnomos.

Para aumentar ainda mais o clima nórdico na fantasia medieval, temos ainda classes novas como o Berserker (basicamente uma releitura do Bárbaro) e as Valkírias à mesa (paladinas exclusivamente femininas). Algumas outras classes velhas conhecidas também foram remodeladas.

Na minha opinião, o grande acréscimo de Asgard RPG está nos aprimoramentos. Existem aprimoramentos raciais e de classe, e os que podem ser obtidos normalmente, como os Talentos de D&D. Eles permitem uma flexibilidade incrível, diferenciando em níveis inimagináveis personagens que antes seriam facilmente identificáveis como da mesma classe.

As mecânicas de combate também não assustam os que já conhecem D&D. Como o ideal da mecânica é usar sempre d6's, as armas apenas variam em quantidade de dados de dano, mas também possuem habilidades especiais, variando de um grupo para outro. Chamo a atenção neste capítulo para a seção de armadilhas. Muito criativas e eficientes no que se propõem. E também por ser algo que nunca encontrei em um livro básico. Eu também não teria muito o que comentar do capítulo de magias, que é bem legal, exceto que senti falta de uma listagem das magias organizadas por nível e classe, bem à maneira da que tínhamos em D&D 3.X. Achei que ficou meio confuso do jeito que saiu, por exemplo, quando se monta um personagem e depois temos que sair catando pulga no livro em busca de "magias interessantes que caibam no nível do meu personagem por ordem alfabética".

Por fim, o livro fecha com excelentes pinceladas do que é o (pelo visto, giga-) cenário "Nove Mundos", em que o Rangarok, o "fim do mundo dos deuses nórdicos" realmente aconteceu, e ameaça acontecer de novo, dessa vez, sem os deuses para defender a existência da conquista pelas forças do mal e caos; além de um capítulo apresentando alguns monstros remanescentes do embate "ragnaróquico" (neologismo do dia!) para os personagens dos jogadores terem no que bater.

Em suma, Asgard RPG é algo que reacende a chama do RPG tal qual ele era nos idos tempos de D&D 3.X. Juntando elementos da mitologia nórdica com referências narrativas a obras de Tolkien e algumas outras influências aqui e ali, ARPG é algo heróico. Num tempo de super-produções, ele é um projeto simples, pequeno e eficaz ao que se propõe. Além de ser, sem sombra de dúvidas, um marco na história do RPG nacional, em que realmente um grupo de amigos pode se juntar para publicar algo próprio, e digno da apreciação de todo o país.

Por mais que alguns ainda possam dizer que ele se aproxima demais da proposta do Vikings da Conclave, acho ambos bem diferenciados. Asgard tem a pegada mais pro lado de D&D, enquanto Vikings é mais "histórico", soturno e inspirado em Cromwell.

Quem quiser matar saudades dos tempos em que magias vinham em graus de dia e nível, certamente se alegrará muito comprando o Asgard RPG. Eu recomendo!

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