25 de abril de 2011

(Série de?) Conto: As Crônicas das Terras Longínquas - Parte 1: O Vilarejo de Vanar

Pois é, gente.

Conforme eu tinha falado no post anterior, ando com idéias para escrever um cenário D&Destico. Não tenho a mais ínfima certeza se esse projeto vai para frente, mas, como que para fazer sucesso no Brasil o negócio parece ter que ser medieval, por que não seguir a moda um pouco?

Abaixo vai um conto bem introdutório, apresentando a atmosfera geral e a origem das raças do mundo. Ah sim. Também preciso de um nome que preste para colocar nesse negócio, no improvável caso de ir pra frente.


As Crônicas das Terras Longínquas - Parte 1: O Vilarejo de Vanar

Aquele foi apenas mais um dia normal de trabalho no pacato vilarejo de Vanar. Os homens estavam voltando para suas casas após a árdua lida nos campos, enquanto os artesãos locais também cessavam suas atividades. A forja do ferreiro não mais tinia, mas permitia que cigarras e grilos agora enchessem de música o bucólico ar da noite. O sol ainda se resignava em conter seu fulgor, colorindo o céu com um laranja intenso quando frei Tilian sentiu algo puxar seu hábito à altura da perna. Era Linus, um dos garotos do vilarejo, agora já à altura de uns oito anos, que tentava chamar a atenção do sacerdote compenetrado demais na faxina da pequena igreja local para notá-lo.

O Vilarejo de Vanar.
“Pode nos contar, frei Tilian?”

“Contar o que, Linus?” Respondeu o frei, com um sorriso, e surpreso por ver atrás de Linus um pequeno grupo de outras crianças. Algumas mais sujas pelas brincadeiras nas ruas de terra, mas todas com um olhar interessadíssimo a Tilian.

“Conte para nós. A história. Dos deuses dragões e de como surgiu tudo.”

Tilian conteve um riso. “Mas Linus, essa história é muito grande,” explicou Tilian. “Tem certeza que você e seus amigos vão querer ouvi-la?”

“Sim, nós queremos. Gostamos de ouvir o senhor contar as histórias que aprendeu na cidade.”

“Hm…” Tilian ponderou, virando o rosto para um caibro no telhado, coçando um queixo de uma boca retorcida. “Mas essa história também dá medo. Não quero suas mães reclamando que não conseguiram dormir por causa dela. Têm certeza de que são corajosos o suficiente?”

“Sim!” Disseram as crianças em uníssono como se fossem um entusiasmado coro ensaiado. “Por favor, frei Tilian, por favor!”

“Tudo bem, tudo bem, crianças.” Concordou Tilian, enquanto acalmava a sedenta classe com as mãos e continha o ranger de seus ossos ao se sentar nos degraus do altar. Logo, estavam todos quietos, e Tillian apertou os olhos para ver o sol se pondo através de uma das janelas. Assim que perceberam isso, os meninos e meninas fizeram o mesmo. “Sabem, crianças, se olharem para lá, verão o sol, o poderoso Lorde Alragor, se pondo. Logo a noite chegará e poderemos ver o brilho cálido da altiva Lady Inara no céu. Foram eles que, há muito, mas muito tempo atrás, criaram todo o mundo em que vivemos.”

“Foi há mais tempo que o meu avô, frei Tilian? Ele também é bem velho.” Perguntou Raquel, com inocentes olhos verdes emoldurados em cachos dourados.

“Sim, Raquel. Foi antes de o seu avô ter nascido. Ou do meu. Ou do avô do avô dele. Foi antes dos homens, dos elfos, ou dos anões. Dizem os escritos sagrados que Alragor e Inara se encontraram no vazio, e ao se encontrarem pela primeira vez, se apaixonaram. Eles se abraçaram, e dormiram juntos por muito tempo.”

“Eca!” Interrompeu Victo, enojado pela idéia. “Lorde Alragor é o mais forte de todos os deuses. E ele abraçou uma menina?”

A pergunta de Victo foi recebida com olhares furiosos das meninas, enquanto os meninos riam. Tilian teve que se conter para não rir junto.

“Sim, Victo. Mas Lady Inara também não era uma simples menina. Sua beleza não podia ser comparada a nada ou ninguém, e o brilho de seu olhar conseguia ir além da mais dura armadura ou escudo de aço divino. Ela nasceu vestida de jóias e prata tão fina, e sua pele era tão clara que podia cegar. Mas foi quando ela encontrou o poderoso e forte Lorde Alragor, ambos se apaixonaram. E enquanto dormiam, sonharam com um mundo cheio de vida, beleza, florestas e animais fabulosos. Mares de azul profundo cheio de peixes. Quando acordaram, encontraram este mundo pronto. E é aqui que vivemos.”

Lorde Alragor e Lady Inara se encontram.
“Frei Tilian, meus pais já fizeram isso comigo.” Anunciou Nicolas, levantando uma mão.

“Isso o que, meu jovem?” Perguntou o intrigado sacerdote.

“No ano passado, no dia do meu aniversário, eu sonhei com a minha festa. Quando acordei, meus pais tinham feito um bolo. Igual no meu sonho.”

“Os pais do Lorde Alragor e da Lady Inara deram o mundo de presente pra eles, frei Tilian? Igual o bolo do Nicolas?” Perguntou Ana, com um olhar ávido, mas inocente.

“Eu sonhei que eu tinha um cavalo. E eu montava nele enquanto ele corria muito, muito, muito. Eu vou ganhar um cavalo também, frei Tilian?” Também perguntou Linus.

“Eu sonhei que caía da árvore e não parava mais de cair, frei Tilian. Eu vou cair da árvore?” Perguntou Lucas, aterrorizado.

Logo a pequena multidão de crianças estava inserida num caloroso debate filosófico debochado da teologia da criação e dos sonhos proféticos. Mas foi com notável classe que frei Tilian reverteu a situação.

“Crianças, calma. Lorde Alragor e Lady Inara não tiveram pais, mas eles são pai e mãe de tudo e todos que existem. E não, nem tudo que sonhamos vira verdade. Só os sonhos bons.”

“Aahhh…” Responderam as crianças, agora esclarecidas e com suas dúvidas sanadas.

Glacerar, deus dragão de aço
“Como eu estava dizendo, Lorde Alragor e Lady Inara encontraram o mundo muito bonito, e decidiram então criar filhos para o povoarem. Foi assim que nasceram os cinco deuses dragões. Lorde Alragor e Lady Inara disseram a eles que cada um deveria criar para si um povo, conforme achassem melhor para povoar o mundo que criaram. Assim, cada deus dragão criou cada uma das raças que hoje povoa o mundo.”

“O deus dragão de aço criou os anões, não é? Eu gosto dos anões. Eles são fortões!” Comentou Victo, exibindo seus precoces bíceps provocando o riso de seus amigos.

“Correto, Victo! Foi Glacerar, o deus dragão de aço quem criou os anões do ferro e da pedra. Por isso os anões são tão fortes. Glacerar também lhes ensinou a forjar os metais, a partir do aço líquido do seu próprio sangue. A primeira cidade anã ainda fica nas montanhas do norte, com a forja sagrada de Glacerar, onde são feitos armas e armaduras perfeitas.”

Haran, deusa dragão esmeralda
“E os elfos, frei Tilian? Quem criou eles?” Perguntou a curiosa Raquel.

“Ah, os senhores das florestas foram criados pela deusa dragão esmeralda Haran. Nascidos nas florestas mágicas do leste, os elfos aprenderam a ver os animais e as árvores como irmãos, pois foram criados da madeira e das garras das grandes árvores e animais.”

“Mas não são cinco deuses dragões, frei Tilian?” Perguntou Linus, contando os deuses dragões nos dedos.

“Sim, Linus. Mas os outros deuses dragões são mais complicados. Os escritos dizem que o deus dragão safira Iuno voou até os mares do oeste, onde junto às praias do continente misturou argila, e soprando nela formaram-se os homens e mulheres humanos. Que somos nós! Os escritos sagrados também dizem que o grande presente de Iuno aos seus filhos foi a coragem e o desejo de sempre saber o que está atrás do próximo horizonte.”

Iuno, deus dragão safira
“É! Eu gosto do Iuno!” Anunciou Linus, a plenos pulmões. “Ele também gosta de cavalos. Igual eu!”

Difícil não ficar feliz com a cena. Tilian deixou que Lucas cavalgasse seu corcel imaginário pela capela ao lado de seu amigo Linus um pouco. Antes isso do que deixá-lo imaginar pelo resto da noite que ele estaria fatidicamente sentenciado a cair de uma árvore infinita. “Mas, por fim, ainda restavam os dois irmãos gêmeos primogênitos e deuses dragões dourados Algaran e Charchadrax. Algaran criou os eladrins. Possuidores do fogo do conhecimento que ilumina suas mentes e jamais se apaga, e que moram nas cidades luminescentes do sul, feitas de ouro, em memória de seu pai, e adornadas com cristal, jade, mármore e toda sorte de pedra preciosa. Mas, por fim, bem…” A fala de Tilian se perdeu. E houve silêncio. “Bem, resta Charchadrax.” Retomou Tilian, parando de novo, boquiaberto e atônito.

Algaran, rei dos deuses dragões
“E o que Xaxadax criou, frei Tilian?” Inquiriu Ana, ao melhor que podia, por entre seus dentes de leite ausentes e olhar doce.

Tilian se levantou, um pouco menos pálido. E ouviu um pio de uma coruja ao longe. “Bom, crianças. Está tarde. Ainda tenho muito o que limpar nesta igreja velha.” Ele colocou as mãos em sua coluna, e a vergou para trás, como quem quisesse estalar os ossos que não fizeram barulho algum. “Esta será a história de amanhã, tudo bem?”

As crianças ressoaram com um “Ah” prolongado de lamento. Curiosas em saber o que Charchadrax havia criado, mas, mesmo assim, o frei Tilian as conduzia para fora de sua humilde igreja, dizendo que já estava tarde. Por fim, apenas o barulho de seus passos e do atrito da vassoura era ouvido novamente para um ouvinte desatento. Mas, bem longe, podia-se ouvir uma ou outra criança animada falando com seus pais sobre a história do frei Tilian, e dos fabulosos deuses dragões. Por fim, frei Tilian sorriu, olhou para o alto numa expressão de agradecimento pela descontração, e por um só momento tentou medir o quanto aquela história ficaria menos aterrorizante não sendo contada à noite.

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PS.: Não percam, no próximo episódio: O Legado de Charchadrax! O Deus Dragão com o maior nome de todos! E perdões pelas imagens longe de serem ideais aos propósitos do conto. Depender do Google Imagens dá nisso.

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