Estamos de volta em mais um tópico da Corte de Inverno que, apesar da seca de comentários, espero ver discutido aqui.
A questão fundamental é até que bem simples. Hoje, temos no mercado incontáveis títulos de RPG, aos títulos mais variados possíveis, indo desde o cotidiano, esperável, original, surpreendente e o realmente bizarro (não chega a ser tanto, mas acho que cabe incluir aí o "Mulheres Machonas Armadas até os Dentes" e o "Pokétchullu", que andam sumidos há um bom tempo. GRAÇAS A DEUS). Em termos de gêneros de ambientação, também temos uma fauna impressionantes: futurista positivista, pós-apocalíptico, medieval fantástico, medieval histórico, oitocentista, oriente feudal histórico, oriente feudal fantástico, oriente médio fantástico, Índia fantástica, América pré-colombiana fantástica, vitoriano, steam punk... E por aí vai. Verdade seja dita, vários cenários que eu consideraria interessantes, até onde sei, realmente não foram explorados em RPG, como a África Negra pré-Grandes Navegações ou até mesmo a cultura americana pré-colombiana (os astecas, por exemplo, são uma fonte bem recorrente, pasmem, no RPG da White Wolf Scion, que já vimos pincelado aqui).
Mas, olhando para o nosso umbigo por um momento, mesmo tendo aqui no Brasil iniciativas mais "contemporâneas" como o NWoD (e OWoD) pela Devir ou o M&M pela Jambô, ou até mesmo o Rastro de Ctchullu pela Steam Punk, tudo isso é quase nota de rodapé se comparadas às iniciativas de RPGs medievais como D&D 4th e 3.x, Old Dragon, Age of Dragon, Pathfinder, Vikings, Crônicas da Sétima Lua e inúmeros outros (não custaria muito para incluir aí também L5R ou Qin, que vira e mexe ainda dão uns gritos aqui no blog). RPGs futuristas estão praticamente mortos no Brasil, e M&M infelizmente não parece ter sido a explosão de popularidade que se esperava, mesmo podendo ter o sistema usado pros mais diversos tipos de narrativa heróica (indo do medieval ao futurista inter-galático, do tom heróico ao épico sem graves problemas).
Tudo bem, o RPG tem profundas raízes históricas com o wargames de estratégia medievais, e o legado deixado por Tolkien é inegável em D&D, que acho que só deixou de ser o "norte" das editoras americanas bem recentemente. Enfim. Também é inegável que o principal charme do RPG é o de "simulador de realidade", e que não faria muito sentido interpretarmos personagens totalmente banais e comuns, inseridos em contextos plenamente banais e comuns de nossas realidades paralelas (como o que vimos nessa tirinha). O diferente sempre é muito mais interessante, e, embora segundo Gombrich, "a apreciação do objeto artístico parta de um princípio análogo entre espectador e obra" (afinal de contas, imagino que ninguém se amarre muito em discutir as influências do berimbau javanês na cultura bizantina), a TOTAL analogia, creio eu, é bastante indesejável.
Congestionamento de cavalos. "Eu falei que era pra jogarmos algo contemporâneo em São Paulo. Lá não acontece essas coisas." ... Até parece. |
Tá, mas e por que o mesmo não funcionaria tão bem, por exemplo, num cenário mais futurista? O pacato cidadão não poderia acordar de manhã, tomar suas pílulas de café, se teleportar para a nave espacial em que trabalha, e na volta para casa, comprar um novo simulador de realidade virtual de viagem aos anéis de Saturno, por exemplo? Hm... Eu não achei "tão" legal assim. Continuo achando que, entre outras coisas, a grande sacada de Star Wars foi dar um toque de "medieval" ao futurista (Jedis sendo quase "cavaleiros templários", defendendo o "Bem" a serviço da "Igreja"), além de um ou outro drama pessoal (Luke indeciso se aceita ou não o Lado Negro, frustrado pelo amor da sua vida ser sua irmã [Eita, novela mexicana!], pelo seu arqui-inimigo ser seu pai, etc.).
Bom, acho que a pergunta então deveria ser por que o RPG medieval acaba fazendo muito mais sucesso (a ponto das iniciativas mais "caseiras" nacionais o seguirem, inclusive) do que os outros gêneros (futurista, contemporâneo, etc.)?